quarta-feira, 13 de outubro de 2010

O banquete das osgas.

"O mundo é um matadouro disfarçado
com as paredes forradas de cetim"

(Adília Lopes, Sete rios entre campos 44)






E como não, e porque não se apaixonar pelo que há de mais sublime na poesia?
É assim que eu poderia definir, sem sombra de duvidas, a produção dessa mulher duplicada. Maria José da Silva Viana Fidalgo de Oliveira, ou simplesmente: Adília Lopes, tornou-se, para mim, uma das mais relevantes poetisas da atualidade. Com um estilo único -e por isso mesmo inclassificável pelos bastiões engessados da crítica- é possível encontrar em Adília um vasto aparato de referências fantásticas e sensoriais que, no seu mundo de possibilidades, rompem o pudor dos oxímoros e passam a conviver na mais absoluta harmonia.
Mas ela é mais! A sua aguçada imaginação lhe permite combinações e criações impensáveis, como as Marias Cristinas refletidas, personagens unas de um mundo avesso, ou um baile da solidão; por onde rodam Didos e Fedras em torno das angústias da poetisa. O sopro criador dessa portuguesa vai além e dá "anima'' a um personagem nascido e morto em meia dúzia de páginas do romance de Diderot; o castrado Poeta de Pondichéry ganha vida e profundidade nos versos (ou na pele) de Adília, sem perder o tom irônico que as contrastantes imagens do poeta (ora aurática, ora desterrada) nos exprimem.
Ler Adília é passear por infinitos bosques de poesia e saber que, a cada passo, se apresentarão diante de nós inúmeras polifurcações. É adentrar um reino cínico e pueril de castelos com papéis de paredes de cerejeiras, que, em pouco tempo, se desprenderão e mostrarão a verdadeira cor dessas paredes; basta ter olhos de ver. Ler Adília é mergulhar no inseguro caminho das possíveis interpretações. É conhecer-se e logo depois descobrir-se farsa.

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